14.6.14

Suave - Capitulo 22 - MARATONA 4/5

 
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NA QUINTA-FEIRA de manhã, eles levantaram as velas ao amanhecer. Joe calculara a navegação estimada e, percebendo que o vento ainda os atingia pela popa, concluíra que, se tudo desse certo, ainda considerando o atraso, chegariam a Key West no sábado de manhã. Ainda lhes dava tempo de sobra para passar pela alfândega, antes do casamento de Taylor, às 16h.

Da parte dela, Demi tentava não pensar em como fora bom contar o segredo a Joe. Ele fora bondoso, compreensivo, acolhedor e fizera com que ela se sentisse… Bem, não iria analisar esse detalhe.

O dia transcorreu de modo agradável. Joe se recuperara tão rapidamente que era como se nunca tivesse sido derrubado pela febre, e Demi aceitou a oferta que ele fizera, de lhe ensinar mais a respeito das técnicas de navegação e funcionamento dos instrumentos. Ele a ensinou a comandar o leme; e ela aprendeu como aumentar a velocidade manejando o barco. A lição que recebeu de Joe foi que “ir em frente era ir mais depressa”. Ela aprendeu que o barco tinha a tendência de se voltar para a direção de onde vinha o vento, causando desequilíbrio, e a respeito de todas as forças que o puxavam e empurravam.

O que mais a surpreendeu foi que o piloto precisava fazer pequenos movimentos com a cana do leme para manter o barco na direção. Quando o vento mudava de velocidade ou o veleiro adernava – ela aprendera que adernar era o termo usado quando o veleiro se inclinava para um dos lados – alterava o leme, forçando o piloto a empurrar levemente a cana do leme para manter o curso, mas, ao final do dia, ela já o estava controlando.

Os dois conversaram sobre assuntos genéricos, evitando assuntos perigosos como sexo. Falaram a respeito de livros de que tinham gostado e ficaram encantados ao descobrir que tinham o mesmo gosto em matéria de literatura. Ambos gostavam de ler histórias de detetives, suspenses arrepiantes e biografias. Falaram a respeito de St. Michael e sobre o que mais gostavam na ilha. Abordaram outros assuntos: animais de estimação na infância, passeios durante as férias, como fazer um sorvete caseiro perfeito.

O dia passou agradavelmente temperado pelo ar do oceano e pelo vento refrescante que os impulsionava na direção da Flórida. Ficaram acordados até tarde, prolongando o jantar – a macarronada que Joe fizera e uma bela garrafa de Chianti –, e depois se dirigiram a camas separadas.

Nenhum dos dois teve coragem suficiente para fazer alguma coisa em relação à atração sexual que existia entre eles.

Na sexta-feira de manhã, Demi descobriu que a impressão que tinha de Joe mudara totalmente. Antes de conhecê-lo realmente, ela achara que ele fosse superficial e arrogante. Agora, ela percebera que ele simplesmente não gostava de lidar com o lado mais sombrio da vida e que tinha o dom de transformar trabalho em diversão. Quem poderia culpá-lo por isso? Era uma habilidade que ela precisava muito aprender.

Ele tinha o dom de fazer com que tarefas comuns se tornassem agradáveis. Não admira que todos quisessem andar em volta dele. Ele a distraíra, encantara e inspirara. A inabalável autoconfiança de Joe, de alguma forma, preenchia os vazios que havia dentro dela.

– Estou com inveja da sua autodisciplina – Ele disse enquanto içavam as velas ao amanhecer.

– E eu estou com inveja da sua habilidade de fazer com que tudo se torne uma brincadeira. – Ela puxou uma mecha de cabelos que o vento soprara sobre o rosto. Desde que entrara no barco, não prendera os cabelos em um coque ou em um rabo de cavalo nem uma vez. Deixar os cabelos soltos fazia com que ela se sentisse mais livre, mais leve. – Pensei que você me achasse extremamente rígida.

– Estou falando sério – disse ele. – Quanto a isso, você me faz sentir incompetente.

– Joe, eu não queria fazer com que você se sentisse desse jeito.

– Você também faz com que eu sinta ter uma missão mais alta, e eu não quero decepcioná-la.

Ela bateu de leve no peito dele.

– Apenas ponha em prática todo o seu potencial.

– Isso é tudo o que eu preciso fazer para ganhar o seu respeito?

– Você já ganhou o meu respeito.

Os olhos dele brilharam de satisfação.

– E quando foi isso?

– Começou no dia em que você salvou aquela gaivota, mas se completou no dia em que você me disse que queria mudar para conseguir Taylor de volta. Eu respeito pessoas que se esforçam para melhorar.

– Você é uma mulher justa e honesta, Demi Lovato.

Os dois ficaram se olhando, com o vento passando em torno deles. Era um momento perfeito: os dois compartilhavam sorrisos, um barco e respeito mútuo.

– Sabe, eu realmente me diverti muito esta semana – disse ela. – Apesar do início inusitado.

– Eu também.

– Estou quase lamentando que amanhã tudo se acabe.

– Quase? – Ele perguntou.

– Bem, você me conhece. É o máximo que eu me permito viver uma fantasia. Mais cedo ou mais tarde, eu preciso arregaçar as mangas e voltar ao trabalho. Muito tempo no paraíso me deixa nervosa.

Ele exibiu um sorriso de dentes perfeitos e deu aquela piscadela maliciosa para Demi, ao mesmo tempo em que o vento inflava a vela grande, e eles começavam a navegar.

Não havia nem uma hora que estavam navegando quando avistaram terra pela primeira vez, desde que tinham deixado St. Michael.

– O que é aquilo? – perguntou ela.

– Pelican Island. É uma ilha fantasma.

– O que é uma ilha fantasma?

– É como se fosse uma cidade fantasma. Há muito tempo a ilha era habitada, mas um furacão, no início dos anos 1990, varreu tudo e só deixou o farol.

– Eu adoro faróis.

– Eu sempre quis desembarcar na ilha. O farol é um famoso ponto de encontro de navegantes que vêm das Bahamas e da Flórida. Pena que não temos tempo para parar e conhecê-la.

– Pena – repetiu Demi.

– Mas vamos passar bem perto dela. Você terá uma visão mais próxima do farol.

Ela passou o leme para Joe e foi para a proa do barco, enquanto o Segunda Chance singrava na direção da ilha. Os últimos dias tinham sido uma revelação. Quando ela se vira na condição de clandestina acidental no barco de Joe, não esperara sair daquela experiência sentindo-se… renovada.

O tempo que passara no mar fora restaurador, um descanso mental do qual ela nem sabia precisar. Estar em mar aberto, cercada pela natureza, fizera com que ela se lembrasse do esquecido espírito indomado. Ela adorava sentir os raios do sol sobre o rosto e as ondas se agitando a seus pés. Sentia-se atenta à vida, totalmente aberta a novas experiências, de um jeito que nunca estivera. E tudo isso se devia a Joe.

Ela deu uma olhada para ele, por sobre o ombro. Ele parecia tão imperiosamente masculino, com as mãos controlando a direção do barco com habilidade, que ela precisou fechar os olhos e umedecer os lábios ao sentir que, na parte mais funda, mais escondida, mais íntima e mais pura, os músculos se contraíam em uma ânsia doce e aguda.

Ele guardava a chave de um universo de sensações e de delícias. O homem sabia como se divertir. Era um sensualista. Um gourmand. Não havia dúvida. Ela sentiu as emoções aflorarem. Sentimentos que mantivera represados desde que cometera um erro na juventude e se apaixonara pelo homem errado.

Estaria cometendo o mesmo erro?

Sim. Não porque Joe não fosse um bom homem, mas porque o coração dele pertencia a outra pessoa. Demi não podia se apaixonar por ele, não devia, mas, por mais força de vontade que tivesse, não conseguia controlar a reação do próprio corpo. A maior reprimenda não conseguiria impedir o sorriso que ela dava toda vez que ele a fitava.

Deliberadamente, ela voltou a atenção para o mar. E, dentro de uma hora, estavam ao largo de Pelican Island.

O farol se erguia em um cais de pedras. Ela pensou na imagem solitária de um faroleiro. Podia vê-lo guardando a luz que evitava que os barcos batessem na ilha. Os faróis eram objeto de lendas românticas e folclóricas… Sereias, ninfas e marujos infelizes jogados com violência, mortos, sobre as rochas.

A ilha tinha formato de meia-lua, e uma pequena entrada na rocha abrigava a água em tom mais claro de azul. Ela viu uma forma se movimentar na enseada.

Seria um golfinho?

Demi franziu os olhos. Não, era algo muito grande para isso e também muito lento. Ele emergiu na água, maior do que uma vaca, cinzento e desajeitado. Elefante. Parecia um elefante aquático, sem a tromba.

Um peixe-boi!

Era um dos famosos manatis da Flórida.

Ela se arrepiou de excitação e correu até Joe.

– O que a deixou sorridente?

Ela estendeu a mão.

– Binóculos.

– O que foi?

– Acho que há um manati perto do farol.

– Tem certeza de que não é um fantasma? – brincou ele, procurando na caixa onde guardava os instrumentos e pegando um estojo preto à prova d’água.

– Fantasmas não existem – Ela disse com ironia, correndo de volta à proa. Ela abriu o estojo, pegou o binóculo, levou-o aos olhos e focalizou as lentes. Levou um minuto para localizar o animal.

Sim! Era um manati grande e dócil.

O manati nadou um pouco com movimentos desajeitados, adiantou-se alguns metros e desapareceu de vista ao mergulhar. Voltou à tona para respirar, alguns minutos depois, exatamente onde estivera antes. Nadou de novo e desapareceu. Reapareceu mais uma vez, nadou e mergulhou, repetindo o processo várias vezes.

Havia algo de errado.

Demi franziu a testa. Tentou melhorar a visão, ajustando o foco, e olhou mais uma vez. Aquilo era um fio preto fino, enroscado em volta do manati? Ou ela estaria vendo coisas?

– Joe! – Ela acenou para ele.

Ele prendeu a cana do leme e correu até ela. Demi sentiu o pulso acelerar e também um nó na garganta.

– O que foi?

– Dê uma olhada e me diga se eu estou imaginando coisas. – Ela passou o binóculo para Joe. – Acho que o manati está enrolado em alguma coisa e está preso.

Joe levou o binóculo aos olhos e observou o animal por longo tempo. O vento sacudia o tecido do short dele, colando-o em volta das pernas bronzeadas. Ele era como o verão. Quente, luminoso e descontraído. A boca de Demi salivava.

– Acho que você tem razão.

– O que é aquilo? Você pode dizer?

– Não dessa distância.

– O que vamos fazer?

Joe abaixou o binóculo.

– Não vamos fazer nada. Não há nada que possamos fazer. Os manatis são enormes.

– Mas eu ouvi dizer que eles são muito dóceis.

– Demi, não é viável. Logisticamente, será um pesadelo tentar fundear o veleiro nesses bancos de pedras.

– Não podemos ancorar aqui e nadar até a praia?

– Isso parece mais fácil do que é. A corrente é muito rápida e, a não ser que você seja uma exímia nadadora…

– Eu sou.

– Não sabemos se conseguiremos salvá-lo. Não temos equipamento para salvar manatis.

– Precisamos tentar. Não podemos simplesmente ir embora e deixá-lo assim.

– Eu envio uma mensagem pelo rádio, comunicando a Guarda Costeira. Eles mandarão alguém.

– Isso pode levar horas. Até lá, o coitadinho pode ter morrido. Ele já está exausto.

– Demi – falou ele em tom carinhoso. – Você não pode salvar o mundo inteiro.

Ela fechou a boca, cruzou os braços e franziu os olhos.

– Você está me olhando com desprezo? – perguntou ele.

– Você merece.

– Por quê?

– Ah, eu já entendi.

– Entendeu o quê? – perguntou ele, intrigado.

– Você acha que levaria muito tempo para ajudar o manati.

– De fato, levaria, e sem garantia de ter sucesso. Além disso, estaríamos colocando as nossas vidas em perigo. É mais seguro para nós e para o manati deixar que a Guarda Costeira cuide disso.

– Você quer dizer que é mais fácil para você. Se pararmos, isso pode impedir que você chegue a tempo de evitar que Taylor se case.

– Sim, também há isso. Aliás, esse é o motivo principal pelo qual estamos aqui.

Ela não conseguia acreditar que ele estivesse sendo tão racional e que fosse o mesmo homem impulsivo que salvara a gaivota com o pé preso na embalagem de plástico. – Você sabe que está se iludindo – murmurou ela.

– Em que sentido?

– Taylor.

– Você está tentando provocar uma briga?

Ela estava?

– Você acha que só porque vai chegar velejando e, como Benjamin Braddock, de A Primeira Noite de um Homem, pedir a ela que fuja da igreja com você, ela vai aceitar. – A cara dele dizia que ela o pegara. – Tenho novidades: se ela quisesse se casar com você, nunca teria rompido o relacionamento de vocês.

– Ela podia não querer se casar com o homem que eu era, mas, quando souber o que eu fiz, poderá mudar de ideia – falou ele com teimosia.

– Isso é pensamento mágico, Joe. Você não pode apenas aceitar o fato de que ela está apaixonada por outro homem?

Ele enrijeceu o queixo, e o olhar dele ficou muito sério. Demi nunca o vira parecer tão desanimado.

– Ela só acha que está apaixonada por ele.

Demi sentiu uma dor no peito e colocou a mão em cima do coração.

– Como sabe disso?

– Por que ela deveria ficar comigo.

– Como sabe disso?

– Porque ela prometeu que me daria um ano e não me deu um ano inteiro. Taylor não costuma voltar atrás quando dá a palavra dela.

– Aí é que está. Você não acha que esse cara deve ser muito especial para ela sequer lhe contar que iria se casar e lhe mandasse o convite via mensagem de texto? O que, para sua informação, provavelmente significa que ela realmente não esperava que você fosse. – Tudo bem, ela se sentiu como se estivesse estragando a festa, mas, qual é, isso precisava ser dito.

– Então, por que ela me avisou? Ela podia ter se casado e deixado que eu descobrisse depois.

Acho que, no fundo, ela queria que eu aparecesse e a levasse para longe.

– Você tem noções muito românticas a respeito das mulheres – disse Demi. – Provavelmente, Taylor lhe contou a respeito do casamento por você ser um amigo de infância com quem ela se importa. Ela quer que você vá para celebrar a felicidade dela, não para acabar com ela.

A raiva brilhou nos olhos de Joe.

– Você nem a conhece.

Demi levantou as mãos.

– Tem razão, mas eu também sei que, apesar da sua atitude de “não me importo”, você não é do tipo que deixa um animal indefeso quando pode ajudar. Você foi para St. Michael e salvou a ilha quase que sozinho. Seus motivos podem não ter sido apenas altruístas, mas o que você fez foi admirável.

– Maldição – resmungou ele, afastando-se.

– Aonde você vai? – gritou ela.

– Lançar âncora. Vá vestir o biquíni rosa, anjo. Vamos resgatar um manati…


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A maratona da mini-fic de hoje já está acabando :/ mas, amanha tem mais uma maratona e se eu conseguir eu posto hoje ou provavelmente pela madrugada, um capitulo de "A Sexóloga" :)
 
Beijoos!! Amo muito vocês <3

4 comentários:

  1. Ai meu Deus, ta perfeito e eu acho que você já cansou de me ver repetir isso toda hora, mas, bem, é só o que eu tenho a dizer. Posta mais, beijooooos <3

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